O Quênia é mais um dos países que fazem a costa leste da África ter tão boa fama. Com uma capital recheada de opções de lazer, reúne ainda vida selvagem, tribos, belas praias e alguns outros atrativos para se visitar.
Informações práticas*:
- Média hospedagem: 4.260 xelins (R$ 148,50)
- Média almoço: 2.330 xelins (R$ 85,50)
- Média jantar: 1.175 xelins (R$ 43,50)
- Visto: é necessário para brasileiros, e um visto único para Ruanda, Uganda e Quênia, o EAC Visa, pode ser tirado na fronteira
- Moeda: xelim queniano (R$ 1 = Ksh28,70)
- Dica: é comum que as compras virtuais exijam pagamento via algum PIX local. Caso você não tenha um chip de celular queniano, as hospedagens costumam ajudar nessa burocracia.
* valores para outubro de 2023 para duas pessoas
Corrida como esporte nacional
Um desses outros atrativos é viver um pouco do esporte nacional: a corrida de rua. O país é casa para alguns dos maiores atletas do planeta, como o atual recordista da maratona, Kelvin Kiptum, que destronou outro queniano, Eliud Kipchoge.
Boa parte desses corredores —e de outras nacionalidades, como o brasileiro Daniel Nascimento— treina a 2.400 metros de altitude, em centros concentrados nas pequenas cidades de Kaptagat e Iten. Como entusiastas do esporte, fomos conferir um desses locais, o Complete Sports Training Center.



Para chegar a uma dessas duas cidades é primeiro preciso parar em Eldoret, a quinta maior cidade queniana. Por ser relativamente grande (são cerca de 500 mil habitantes), é relativamente fácil ir até lá, tanto a partir da capital, Nairóbi, quanto de Kampala, capital de Uganda, de onde vínhamos.
Nosso ônibus nos deixou no centro da cidade pouco depois da 1h da manhã, contrariando nossa vontade de evitar chegar muito tarde a nossos destinos. Para a nossa surpresa, no entanto, a principal via estava muito bem iluminada e com alguns vendedores ambulantes, além de vans que esperavam passageiros para partir a Nairóbi. Esse ambiente nos deu segurança e andamos até o hotel.
Passamos a noite —ou parte dela— no Merril Hotel (4.260 xelins quenianos/R$ 150), que tinha café da manhã incluído. Na manhã seguinte, por volta das 10h30, pegamos um matatu (150 xelins/R$ 6 por pessoa), uma van extremamente comum no país, em direção a Kaptagat.
Perto do meio-dia, estávamos chegando a Complete Sports, que fica a cerca de 2 km da estrada principal. Havíamos feito a reserva no sábado, pelo site deles. Como ainda estão no início, porém, só a viram na segunda, quando já estávamos a caminho —mas isso não afetou a hospitalidade do local.
A ideia do centro do treinamento existe desde 2012, mas este espaço abriu para hóspedes externos (além dos atletas) apenas em julho de 2023. Ou seja, três meses antes de irmos para lá. Com quartos duplos e triplos criados para ajudar a patrocinar os corredores quenianos da região e pensados para entusiastas do esporte, a estadia sai 36 euros por pessoa (R$ 200) com pensão completa. O preço dá ainda acesso à futura academia e oferece a possiblidade de treinar com os atletas de lá.
Com o pace 7min30seg (tempo em que se completa 1 quilômetro), poderia-se pensar que a Pati ficaria envergonhada em treinar com as jovens de 20 e poucos anos. E ela ficou. Mas o senso coletivo que os quenianos têm, mesmo em um esporte individual, faz qualquer um esquecer que não é profissional como elas. Acompanhamos a easy run da tarde (o terceiro treino do dia), que com certeza foi mais fácil do que estão acostumadas —nem pense em tentar caminhar, porque ninguém fica para trás.
Além da altitude, outros detalhes interessantes dos treinos lá são a frequência —são três ao dia—, a disciplina —de segunda a sábado, sem falta— e o terreno —todos na terra. Há ainda um forte componente de religiosidade, pois, segundo eles, é importante fortalecer o espírito tanto quanto o corpo. Por fim, é preciso ter bom desempenho acadêmico, já que o objetivo é conquistar bolsa para alguma universidade.
Como visitantes, foi muito interessante viver e observar este mundo. A pensão completa é um detalhe à parte, pois a comida é muito boa e bem-servida. Outro componente farto é a simpatia de todos, dos funcionários aos atletas.
Nairóbi, cosmopolita e conturbada
De Eldoret para Nairóbi, há muita oferta de shuttle, vans com 11 assentos que estão, na nossa escala de conforto, entre os matatus e os ônibus, pois têm mais espaço do que os primeiros, mas menos reclinação das poltronas do que os segundos —até agora tentamos entender o porquê de um queniano nos dizer que seria mais agradável viajar nesse tipo van do que num ônibus.
Nosso veículo saiu às 20h e chegou às 3h, com música alta do início ao fim. Imagine nosso humor após 8 horas sem conseguir dormir. Para nossa surpresa, o shuttle estacionou em Nairóbi e nada dos demais passageiros descerem. Só depois soubemos que é comum as pessoas aguardarem amanhecer para seguirem para seus destinos, enquanto queríamos sair dali o quanto antes e arranjar um lugar para finalmente descansar.

Assim como Eldoret, Nairóbi é bastante iluminada de madrugada —isso é novidade para nós, que passamos por inúmeros lugares totalmente no escuro durante nossa viagem pela África. Como já tínhamos pesquisado hotéis na capital, rumamos para um deles, que tinha um nome na fachada (Raya) e outro (Kipepeo) nas plataformas de hospedagem.
Na primeira noite, no balcão, nos cobraram 4.500 xelins (R$ 157) o quarto, enquanto nas demais diárias, quando fizemos reserva pelo site, pagamos 2.550 xelins (R$ 89). Coincidentemente, quando mudamos de quarto, nos colocaram em um onde o Wi-Fi não funcionava. Depois percebemos que funcionou no primeiro porque era madrugada, quando a demanda era bem mais baixa. Nas demais noites, a internet era ruim mesmo ao lado da recepção.
Esse problema de conexão nos incentivou a procurar cafeterias, e precisamos andar um tanto para fugir da conturbada região da River Road, onde muitos vendedores estendiam seus produtos em toalhas na calçada. Ali também se concentram vários matatus, o que força o pedestre a decidir se prefere andar entre mercadorias ou veículos. Ainda bem que anos vivendo no centro de São Paulo nos deram alguns ensinamentos.
Concentramos nossos dias em unidades de duas redes de cafeteria, a Java House e a Artcaffé, ambas com bom atendimento, fartos cafés e deliciosos pratos. Mas, ainda assim, tivemos alguns problemas digitais: na primeira, o Wi-Fi ficou inutilizável em uma das visitas, enquanto na segunda rede o Faraó não conseguiu conectar seu notebook à internet.
Infelizmente, não aproveitamos a capital queniana como gostamos de fazer, o que inclui ir a museus ou parques —estamos num momento da viagem em que temos mais demandas profissionais do que tempo livre—, mas algo que nos chamou muito a atenção foi a quantidade de vendas informais de livros nas calçadas, com obras que vão de ficção a biografias de Thomas Sankara, importante líder político africano, e Michelle Obama, ex-primeira-dama dos EUA.
Paradisíaco litoral queniano
Dois viajantes diferentes indicaram Diani Beach como um ótimo destino se você gosta de praia, e para lá rumamos. Facilita a vida ser perto de Mombasa, a segunda maior cidade do país, então há muitos ônibus e shuttles circulando, além de um trem, meio de transporte que não víamos desde a Tunísia, nosso primeiro destino africano.
Optamos por um ônibus da Tahmeed (1.300 xelins/R$ 45 a poltrona) e, após uma péssima noite de sono, com ambos sofrendo com diarreia, enfrentamos 8h30min horas entre as duas cidades. Infelizmente, há muito trânsito para sair da capital e um bom trecho de estrada ruim para chegar a Mombasa.
Na cidade portuária, conseguimos um Uber que nos levou a Diani Beach. Enquanto pagamos 2.050 xelins (R$ 76) pelo aplicativo, um motorista de tuktuk quis nos cobrar 6.000 xelins (R$ 210) e, num arroubo de negociação, nos ofereceu levar por 4.000 xelins (R$ 140). Por essas e outras que preferimos, sempre, utilizar a plataforma de transporte, que cobra preços mais honestos. Infelizmente, uma viagem que deveria levar 1 hora durou o triplo por causa do congestionamento de sexta na balsa.


Em Diani Beach, nos hospedamos em dois lugares diferentes, ambos agradáveis e com boa internet: V-Szameitat Homes (4.260 xelins/R$ 148) e um Airbnb (R$ 148). Nos mudamos apenas porque no primeiro endereço não tinha mais vaga para as demais noites, um problema a que estamos sujeitos quando reservamos o local dia a dia.
No quesito beleza, a praia de Diani não fica muito atrás de Zanzibar, com uma faixa de areia curta e água de azul-turquesa. E há bem menos assédio de vendedores aos turistas. Mas, diferentemente do destino tanzaniano, aqui há poucos empreendimentos à beira-mar. Na principal via, no entanto, vimos vários restaurantes voltados aos estrangeiros —principalmente seus preços.
Como é viajar de trem no Quênia
Para voltarmos a Nairóbi, optamos pelo trem, e a viagem foi bastante agradável. Há uma certa burocracia para comprar as passagens, já que o site só aceita pagamento em M-Pesa, o Pix local, e precisamos apelar para o funcionário de uma farmácia para realizar a transferência.
Tanto a estação de Mombasa quanto a da capital são distantes do centro, o que exige chegar lá com Uber ou matatu, mas os prédios são enormes e modernos, lembrando muito a infraestrutura de gares europeias. A segurança também é bem reforçada.
Próximo à entrada, precisamos descer do carro enquanto um funcionário o checava. Depois, passamos por uma revista canina, quando dois cães farejaram todas as bagagens, enfileiradas. Também passamos por checagem pessoal e passamos as mochilas por raios-x.

Como tínhamos apenas um comprovante de pagamento das passagens, precisamos ir a totens imprimir os bilhetes, o que foi feito rapidamente. Ainda nem tínhamos entrado no prédio e tivemos que entregar os passaportes a um funcionário para ele conferir se os dados batiam com os tíquetes. Na sequência, mais um raio-x. E aí vem uma pequena tristeza.
Desde a viagem de carro pelo sul do continente eu carrego um botijão de gás, além de um fogareiro e uma cafeteira. E nesse raio-x um funcionário encrencou, com toda a razão —a dúvida que fica é: passei minha mochila em tanta máquina e ninguém reparou no item?.
Pedindo desculpas, avisei que jogaria fora o botijão, já que é um item perigoso. O homem insistiu para que eu mantivesse o objeto comigo, mas que deixasse um presente. Como somos contrários a pagar propina, eu fui mais incisivo sobre me desfazer do problema. No fim, ele nos deixou seguir viagem e alertou para que isso não se repetisse. Estava indo tão bem nossa experiência ferroviária.
Dentro do prédio há algumas lanchonetes, e tomamos lá nosso café da manhã —a orientação, na compra da passagem, é que o viajante esteja no local uma hora antes da partida, o que nos deu tempo de sobra para comer, já que o trem partiria às 8h.
O trem, fruto da parceria entre Quênia e China, é moderno, com direito a banheiro e lavatório, algo impensável em tantos transportes que pegamos nos últimos meses. Não sabemos como são os assentos da primeira classe (3.000 xelins/R$ 105), mas os da econômica (1.000 xelins/R$ 37) não reclinam. E a configuração das poltronas é de 3 passageiros de frente a outros 3, com uma mesinha no meio. Quem sabe um dia esse tipo de veículo chegue ao Brasil?
Sem atrasos, chegamos à capital às 14h. Lá, pegamos um matatu (200 xelins/R$ 7) para o centro, onde nos hospedamos em outro local desta vez: no Hotel Embassy (US$ 37/R$ 86), tivemos direito a escrivaninha no quarto e farto café da manhã, além de boa internet. E a região é bem mais agradável que a anterior.















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