O que é que Gana tem? Era uma pergunta que nos fazíamos, porque quase todos os viajantes por essas bandas falavam de como o país era legal, ou até mesmo o mais legal. Ainda que tenhamos ficado só na Grande Acra, já pudemos entender um pouco do porquê: pessoas gentis, uma cidade cosmopolita e boêmia e uma boa praia perto foram alguns dos motivos a nos conquistar.
Informações práticas*:
- Média preço café da manhã: 80 cedis (R$ 33)
- Média preço almoço: 84 cedis (R$ 35)
- Média preço jantar: 112 cedis (R$ 47)
- Média preço hospedagem: 309 cedis (R$ 131,50)
- Deslocamentos: ônibus, van e Uber
- Visto: é necessário para brasileiros, e obtemos o nosso na Libéria
- Moeda: cedi (R$ 1 = 2,36 cedi)
- Dica: é muito comum que o motorista de Uber pergunte a forma do pagamento e, se for com cartão, ele cancele. Então, ou pague em dinheiro ou peça com antecedência o carro, para ter tempo hábil para tentar uma corrida mais de uma vez.
* valores para fevereiro/março de 2023 para duas pessoas
Pontos turísticos
Não é lá muito agradável bater perna por Acra —Gana fica próximo à linha do Equador, então o calor é tropical mesmo no dito “inverno”. A capital, no entanto, reúne alguns pontos turísticos que contam a história do país.
A Black Star Square, por exemplo, ostenta um arco com uma estrela preta em celebração à independência de 1957. É possível subir no monumento pagando uma gorjeta para quem fica ali embaixo, mas optamos por seguir nossa volta. Uma enorme praça ali em frente também homenageia a conquista histórica e até hoje recebe discursos oficiais.

Também na região central fica o Museu Nacional de Gana (50 cedis/R$ 21 a entrada), que conta não só a história do país como da região africana, no piso térreo —e essa amplitude de assunto, infelizmente, faz com que a visita seja pouco aprofundada. Ainda assim, dá para saber um pouco mais sobre povos originários como o Asafo, um grupo tradicional militarmente organizado que surgiu no século 17.
Já no segundo andar o museu foca a história pós-independência. Há peças como uma cadeira usada na posse de Kwame Nkrumah em 1960 —ele liderou o país até 1966— e bustos dos seis “pais fundadores” de Gana, que estampam as notas de cedis.

Outra região histórica de Acra é Jamestown, onde ficam o Ussher Fort, que pode ser visitado, e o Farol de Jamestown, além de prédios coloniais ainda conservados. Em vez de visitar esses locais, no entanto, preferimos concentrar nossos esforços financeiros no Osu Castle.
Mas antes de entrarmos nessa visita, ali perto fica o Adomdwee Park, construído em homenagem a John Evans Fifi Atta Mills, presidente de Gana entre 2009 e 2012. Há um belo jardim, uma enorme bandeira do país e o túmulo onde a população vai prestar homenagem ao falecido ex-mandatário.
A triste história do Osu Castle
A construção do Osu Castle é basicamente a história das invasões de Gana protagonizadas por diferentes países europeus, o que liga também o país ao Brasil. Construído em 1661 pelos dinamarqueses, o local teve uma expansão feita por portugueses e no fim foi ocupado por britânicos. Mas vamos contar essa história direito.
Os dinamarqueses ergueram o prédio para “gerenciar” os escravizados que compravam em Gana. A localização do castelo, à beira do golfo da Guiné, ou seja, do oceano Atlântico, era estratégica para o envio de ganenses para as Américas, o Brasil incluído.
O comando dinamarquês não durou muito tempo, pois os portugueses logo quiseram garantir o seu quinhão. No fim do século 17, ocuparam Acra e o castelo por dois anos, tempo suficiente para construir a primeira Igreja Católica de Gana.
O objetivo, no entanto, não era apresentar uma fé diferente —muito menos forçá-la, como fizeram com os indígenas no Brasil—, mas sim usá-la para atrair a população local ao castelo. No fim da missa, sob a mira de armas, eles leram levados a masmorras.
Quando os dinamarqueses voltaram, a situação continuou igual. Os escravizados eram mantidos nas masmorras por meses, onde ficavam fracos e não ofereciam resistência ou tentavam fugir. Muitos, inclusive, acabavam cegos ao serem expostos à forte luz solar após tantos dias aprisionados.

Próximo à saída para um canal que levava ao mar havia masmorras subterrâneas, com divisões para homens, mulheres e crianças de 10 a 18 anos —esta com design especial, pois foi construída embaixo de um pequeno lago artificial para que a água abafasse seus gritos. As crianças eram enviadas para lá por um túnel subterrâneo que dá no antigo castelo do rei de Acra, que se aliou aos dinamarqueses e ordenava o sequestro dos menores.
Em meio a uma história tão triste e pesada, é difícil imaginar que até hoje o governo utiliza o Osu Castle como sua sede, mas esse é o dia a dia do local. Por esse motivo, a visitação (50 cedis/R$ 21) só é feita aos fins de semana. É possível ver, a distância, o escritório de onde o presidente despacha.

Todos ocuparam o gabinete, exceto Jerry Rawlings, ditador que ficou 19 anos no poder (11 sob regime militar e 8 eleito). Ele escolheu uma sala de onde poderia ver a entrada do castelo, eliminando assim a resistência e frustrando 13 tentativas de tirá-lo do poder ao longo desses anos.
Boêmia e cosmopolita
Depois de uma história tão triste, é incrível como Acra se tornou uma cidade tão dinâmica —e boêmia. A região mais conhecida é Osu (fala-se ossú), com vários restaurantes e bares mais ocidentais, no mesmo estilo que se tem em grandes cidades brasileiras.
Fomos algumas vezes ao Breakfast to Breakfast, que, como você pode imaginar, funciona 24 horas por dia. Gostamos tanto do cardápio farto que experimentamos café da manhã (70 cedis/R$ 29 por pessoa), almoço (75 cedis/R$ 31,50), café (30 cedis/R$ 12,50) e sobremesa (27,50 cedis/R$ 11,50). Pesou também a conexão à internet.
Aproveitamos a cotação do cedi, favorável ao brasileiro, para termos nossa primeira experiência num bar do continente, e o escolhido foi o Zen Garden. Com estilo mais local, o espaço tem os tradicionais petiscos noturnos, como batata frita ou onion rings, e inúmeros drinques —inclusive sem álcool, para alegria do Faraó—, além de música ao vivo. Ele não fica em Osu, mas sim no vizinho Labone.
Outra região em que é possível encontrar restaurantes/bares é na orla, em Labadi beach. A praia, no entanto, deixa muito a desejar. Andamos um bocado na areia e vimos, não muito longe do fervo, esgoto desaguando no mar e alguns montes de plástico, comum em grandes cidades da região.
Praia ganense
Isso quer dizer que não aproveitamos uma praia em Gana? Longe disso! O país tem 550 km de costa, então em algum ponto daria para entrar na água. Escolhemos Kokrobite, a cerca de 30 km de Acra, para isso. A indicação foi de um funcionário carioca da embaixada brasileira no país e, por ser da mesma origem que a gente, botamos fé que o gosto seria semelhante.
Como nos hospedamos no Big Milly’s Backyard, com acesso direto à praia, podíamos deixar nossas coisas no quarto (209 cedis/R$ 87 com ventilador) e ir só com sunga e biquíni para a água.
Facilitou bastante nossa vida o hotel ter restaurante e bar com preços mais em conta, e mal saímos de lá. Apenas em uma oportunidade fomos ao hotel vizinho, Kokrobite Garden, para comer uma saborosa pizza (140 cedis/R$ 59).
Fomos para a cidade sem planos e, a cada dia, pedíamos na recepção uma diária a mais. No fim, ficamos cinco dias lá. O que mais influenciou nossa vontade de passar mais tempo no local foi a praia, que desde a Serra Leoa não curtíamos. Gostamos tanto de lá que a Pati até fez sua primeira aula de surfe. Mas, infelizmente, não podemos omitir que a água tinha várias sacolas plásticas.
Simpatia da população
Gana nos conquistou também por causa da simpatia das pessoas. Desde que entramos no país, em Elubo, após cruzarmos a fronteira com Costa do Marfim, percebemos a gentileza da população. Lá, perguntamos para uma vendedora de frutas sobre transporte para a capital e, após nos dizer valores, ela foi até a garagem para conferir se tínhamos conseguido nos achar.
Nas ruas, as pessoas costumam dar “bom dia”, com um sorriso no rosto, e em vários restaurantes os atendentes tentavam nos explicar da melhor maneira possível o cardápio.
O melhor exemplo foi a garçonete que nos sugeriu comer banku, uma espécie de polenta de mandioca, e que ficou extremamente feliz quando dissemos que adoramos o prato. Antes de irmos embora, ela ainda nos recomendou provarmos banku com tilápia, que é a versão mais tradicional.
Por falar em restaurante, muitos locais aceitam pagamento com cartão, algo bem incomum na África Ocidental. Em ao menos quatro locais pudemos usar dessa tecnologia, assim como no hotel em Kokrobite.

Outra facilidade do dia a dia ocidental em Gana é a abundância de motoristas de Uber. Abusamos do uso do aplicativo, já que não era preciso negociar o valor com o motorista, algo muito comum em terras sem taxímetro. Sem falar que o preço é o mesmo se você é nativo ou estrangeiro.
Assim, entre pequenos confortos cotidianos, boa receptividade das pessoas e dias de praia, ficamos quase três semanas em Gana, nos lembrando dos bons momentos em terras brasileiras.


























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